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Artigo: Fim do celibato e a renúncia do Papa

Há 482 anos, exatamente num dia 31 de outubro, um padre católico, doutor em Teologia, afixava na porta da igreja do castelo de Wittemberg, na Alemanha, um texto em latim com 95 teses que contrariavam os dogmas da Igreja Católica. Chamava-se Martino Lutero e entre suas divergências com o Vaticano estava o celibato clerical. Um de seus biógrafos, analisando as críticas, destaca: “Por causa da proeminência do teólogo Martinho Lutero, muito pouca atenção é dada ao marido Martinho Lutero. No entanto, escondida nos seus ensinos está a presença sempre influente de sua esposa, Katherine von Bora Luther, uma ex-freira”.

Quase cinco séculos depois o celibato volta às manchetes do mundo inteiro, como um dos motivos da renúncia do Papa Bento XVI. E volta a ameaçar a unidade da Igreja, como um dos fatores responsáveis pela pedofilia e toda sorte de abusos sexuais que vem sendo denunciados contra prelados católicos.

Vozes poderosas, como a do cardeal britânico Keith O’Brien, 74 anos, defendem a revogação da proibição de casamento dos sacerdotes. O Cardeal renunciou ao governo pastoral da arquidiocese escocesa de Saint Andrew e Edimburgo, ao ser acusado por três sacerdotes que afirmam ter sido vítimas de condutas sexuais impróprias por ele na década de 80. E informou que não votará no conclave para escolher o novo Papa. Recentemente o cardeal se converteu no alvo da imprensa, pelas declarações à BBC a favor da abolição do celibato sacerdotal. Em suas declarações O’Brien, o mais importante na hierarquia da Igreja Católica britânica, disse que a regra que impõe o celibato aos sacerdotes não é de origem divina. Sem falar na barreira que cada vez mais impede que a juventude entre nos seminários.

O celibato dos padres e a admissão de mulheres ao sacerdócio, questões recorrentes nas últimas décadas, estiveram em discussão no pontificado de Bento XVI. Numerosos teólogos e alguns bispos pregam abertamente o fim de uma lei eclesiástica que proíbe o casamento para os sacerdotes de rito latino, atrelando essa exigência à vocação para o sacerdócio. O papa Ratzinger insistiu no celibato, toda vez que falou para padres e seminaristas.

Em fevereiro de 2011, o jornal Süddeutsche Zeitung, divulgou um manifesto assinado por 144 professores de Teologia da Alemanha, Áustria e Suíça pedindo o fim do celibato no bojo de uma série de exigências de reformas na Igreja. O documento pedia ainda a ordenação de mulheres e a participação popular na escolha de bispos. Segundo o os teólogos, “o número de signatários seria maior, se muitos não temessem represálias do Vaticano”.
Mas o cardeal alemão Walter Kasper, prefeito emérito do Conselho Pontifício para a Promoção da Unidade dos Cristãos e amigos do papa Bento XVI, na ocasião, afirmou que “o Papa não estava disposto a abrir mão do celibato clerical.”.

O teólogo E. Miret Magdalena , analisando a questão a luz das pesquisas que vem sendo realizadas nos Estados Unidos, destaca: “As notícias reveladas dão conta que parte do clero não cumpre nem respeita o celibato e que violentar freiras e noviças, não é senão consequência da férrea lei que impede o clero de casar. Estatísticas do país das pesquisas, os Estados Unidos, revelam um mar de lama que a hierarquia católica quer silenciar. Apenas de vez em quando algum fato com potencial de escândalo vem à tona. E isso quando vem”.

Segundo o professor jesuíta da Universidade de Harvard, o padre Fischler, 92% do clero norte-americano revelam que se sacerdotes pudessem escolher livremente, queriam ser casados. Já outro sacerdote e psicoterapeuta, o padre Sipe, revelou que só 2% desse clero cumprem o celibato, 47% o fazem ‘‘relativamente’’ e 31,5% vivem uma relação sexual, das quais um terço homossexuais. Diante disso, vários bispos têm solicitado que se elimine o celibato para o clero latino, já que o oriental — inclusive o ligado a Roma — não tem essa obrigação e é, normalmente, casado. Até mesmo o Concílio Vaticano II louvou o sentido espiritual do sacerdote casado.